Cansei desse negócio de tentar ser bom.
Cansei dos meus retratos da falsa sensação.
SILVA.
Dizem por aí que ele tinha crescido. Ainda que usasse o mesmo humor ácido e alguns sorrisos amarelos para situações embaraçosas, ainda que tivesse mudado pouco seu guarda-roupa, ainda que gostasse daquele urso velho de tanto tempo que fica sobre sua cama. Ainda que o tempo trouxesse resquícios e ele tivesse tão próximo de atravessar uma linha imaginada e desenhada para fechar um ciclo, ele simplesmente se sentia pequeno.
Mais cedo, o viram em frente ao espelho, descabelado, rosto inchado, mas ainda sem rugas. O reflexo era turvo, cheio de imperfeições, parecia simplesmente ter perdido os óculos que antes o encorajaria para encarar qualquer coisa. Não sabia qual rua seguir, se quer um atalho o empolgaria. Ficou por horas ali, em frente ao espelho, esperando a insegurança passar para que vestisse de novo o personagem tão bem acabado e convincente que todos torciam no final de uma seriado qualquer. Insegurança vestida de amores quase tão bem resolvidos quanto os dias da próxima estação. Demorou de passar. Demorou de chegar. Desistiu por hoje e voltou para o macio de sua coberta em um dia que nunca conseguiria ser colorido ou preto e branco, apenas rabiscado em tons de cinza.
Dizem por aí que ele dormiu até que pudesse voltar à cena em tons de vermelho escarlate e com um sorriso tão mais ácido que seu humor. Até então, o espelho havia continuado turvo!
Texto de Patrick Moraes
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