segunda-feira, 20 de junho de 2016

O que sobra é sua falta


Para ler ouvindo "Quase Sempre"

Desculpa vir aqui novamente para falar sobre nós dois. Depois que você se foi, meu orgulho decidiu que não havia volta, não havia chance, não havia recomeço. Nossos caminhos seguiram rumos diferentes e eu decidi te esquecer na próxima curva, por escolha ou decreto. Decidi que, daquele adeus em diante, todos os afetos virariam pó e todas as lembranças seriam encaixotadas no porão que construí para abrigar o que não cabe mais na vida.

Duas semanas depois, sua ausência não incomodava tanto. O que antes sufocava virou alívio. Não tinha lugar para saudade. O vazio que a tua falta deixou foi o mesmo que me deu espaço para respirar: leve, corajoso e libertador. A incerteza do futuro ainda não estava nos planos, que, por sinal, acabei deixando para recomeçar depois. Um mês depois, as certezas foram embora e aqui estou eu: derrotado em mais uma luta contra nós dois.

Mesmo com a porta encostada e sua ausência no quarto, o lençol da cama está bagunçado e todas as poesias que escrevi em segredo permanecem guardadas na última gaveta, onde escondo aquilo que o coração nega. Você ainda está presente nos bilhetes espalhados pelos meus cadernos, no barbeador usado em cima do armário do banheiro, nas mensagens no celular que ainda não tive coragem de apagar, nas fotos da nossa primeira viagem espalhadas em meu mural. Você ainda se esconde na camiseta velha que você usava quando dormia aqui em casa, no seu lugar preferido para ver o jogo de futebol aos domingos, nas rolhas de cada vinho que guardávamos no pote em cima da estante da sala.

Mesmo que eu insista nessa história de que tudo virou passado, é meu travesseiro quem sabe o quanto nossas lembranças ainda são presentes noite após noite. É teu cheiro forte em outro pescoço que insiste em dizer o quanto a ausência da tua pele dói. São as músicas que cantávamos juntos dentro do carro que continuam fazendo sentido. São todas as crônicas, poesias e frases soltas que leio na tentativa de encontrar uma explicação para o que fomos ou, involuntariamente, criar a ilusão do que seremos.

Desculpa mais uma vez por vir aqui falar sobre nós dois. Eu continuo seguindo daqui, te desconhecendo dia após dia, refazendo meus planos noite após noite, aprendendo a conviver com os pedaços que você deixou em minha vida. Um dia, todas as nossas lembranças ganharão um novo sentido e você irá embora por inteiro. Só assim, eu saberei o que é viver com a sua ausência sem lidar com a saudade de nós.

Texto de Patrick Moraes
Foto de Ricardo William

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Quando o amor virou passado


Para ler ouvindo "Calma aí"

Antes que você vá embora de vez, eu preciso confessar: eu te amei! Dos beijos no começo da manhã até o sussurro de "bons sonhos" na última mensagem de despedida. Dos olhos brilhando no seu pedido de nos fazer eterno até o cheiro do seu perfume que restava no travesseiro todas as vezes que você dormia aqui.

Eu te amei em cada vírgula da nossa história torta, em cada lágrima que escondi no escuro do quarto, em cada sorriso que suas surpresas provocaram. Eu te amei como quem esquece até mesmo de amar a si. Eu te amei nos goles de cerveja que dividimos no boteco da esquina, nas taças de vinho em noites que eram só nossas, nos devaneios noturnos em que meu prazer era seu orgasmo.

Antes que você feche a porta de vez, eu preciso te contar que você foi o meu melhor sonho e o pior pesadelo. Durante todos os dias que estive ao teu lado, eu te amei até mesmo na instabilidade que era te amar. Das suas friezas em dias de mau humor até a sua mania de me segurar no colo até eu confessar que era somente seu. Eu te amei quando a falta de razão era a única explicação para o amor.

Eu te amei até não saber amar mais ninguém, até desistir de encontrar em outros olhos o inexplicável que os seus me mostravam. Eu te amei mesmo depois da porta fechada, do celular continuar mudo, de te ver sorrindo em cada nova foto publicada. Eu te amei na imensidão da saudade, na solidão que a sua ausência causou e em cada foto que rasguei na tentativa de esquecer você.

Antes que eu perca a coragem, eu preciso te contar que eu realmente te amei. Mas assim como todo verbo encontra o tempo certo para existir, meu coração soube onde te colocar em minha história. As noites que me trouxeram a certeza do nosso amor, também confirmaram que sua ausência deixou de ser falta e passou a se chamar sossego.

Texto de Patrick Moraes
Foto de Matteus Palmeira