domingo, 17 de fevereiro de 2013

Uma xícara de chá

- Mãe, meu chá acabou!
- Não tem mais, filho.
- E de outro sabor? - implorava com olhos nostálgicos e sedentos.
- Você não iria querer misturar com as últimas gotinhas grudadas em sua xícara, iria?


O pano de mesa continuava florido, mesmo que, mais cedo, você tivesse derramado chá e, sem querer, o amargo da sua boca ainda refletisse na falta de açúcar do pote transparente. Aproveitamos a sua derradeira falta de atenção e resolvemos nunca mais marcar outro café daqueles. Nem chá, nem suco, nem água, nem um oi. Não combinávamos mais com torradas, geleias, toalha de mesa de morangos ou mesmo duas xícaras de louça japonesa com sachês usados no pires.

Rearranjaram as cadeiras e a que sempre foi sua puseram intencionalmente do outro lado da casa, escondida no sótão para que eu nunca fosse capaz de ir buscar. Meu medo de escuro só perderia para minha rejeição por poeira, exatamente como nós dois provavelmente acabaríamos: empoeirados e escondidos. Por medo, acreditei que a nova combinação de cadeiras da sala de estar ficaria incrível com o tempo. Por saudade, acreditei que era tudo uma questão de costume. Por amor, fugi da cama à noite e fui a passos curtos e miúdos naquele esconderijo onde te guardaram só para mais uma vez saber que você estava lá.

De manhã, as cadeiras, os chás e a toalha de morangos sorriam em tons de bom dia, sem saber que naquela noite eu quebrei o acordo de aceitar mudar a sala de estar por pelo menos alguns dias. Abri mais um sachê do último chá que dividimos e percebi que pouco importava se os outros sabores eram deliciosos. Hoje, era só o seu aroma que eu precisava pra sorrir mais uma vez. Mesmo que dessa vez eu só precisasse de uma xícara e a sua cadeira.

Texto de Patrick Moraes

"Pra onde elas vão? Embora." Cícero

Um comentário:

João Victor. disse...

Patrick, lindo! Meu, meu, meu...
Tem veia minha em sua mão, essa é a única explicação.