quarta-feira, 27 de maio de 2015

A verdade escondida sobre nós dois


Para ler ouvindo "Suspiro"

A verdade é que você ainda mora em mim. As nossas fotos da viagem de janeiro, os bilhetes amassados com sua letra corrida, os sorrisos que engavetei na lembrança. O anel de brinquedo do seu aniversário surpresa, a dedicatória daquele livro de poesias que ficou meses na minha cabeceira, os beijos roubados. O brilho nos olhos quando nos encarávamos na cama, o cafuné distraído enquanto assistíamos ao seu filme favorito, o encontro de nossas mãos no meio da multidão. A verdade é que tudo isso ainda se esconde aqui.

Nossa casa arejada, nosso filho sorridente, o sonho de sermos melhor a dois. Nosso caso de amor secreto, suas pirraças matinais, nossa promessa de eternidade. Que tolice acreditar no eterno! A verdade é que a gente sempre fica tolo quando acredita completamente no amor. E o que é o amor senão a idealização do bem-estar eterno? Sem se dar conta, a gente inventa esse mesmo amor com a desculpa de ser feliz e corre o risco de desabar depois. No fundo, a gente sabe que o risco é grande, mas prefere ser audacioso e investir alto na possibilidade da fábula do pra sempre.

A verdade é que eu sempre disfarcei bem nosso fim. Acostumei a virar a página, escrever de novo, reinventar o amor nas frases invertidas ou nas reticências que dão o tom final. Aceitei nosso fim como uma verdade que nunca coube aqui dentro. Fingi. Disse adeus, acenei com um sorriso, mas enxuguei os olhos assim que te dei as costas. Era para ser só uma lágrima, mas inundou meu peito. Era para ser só um dia, mas prolongou. A verdade é que eu menti para deixar a vida seguir sem tanto sofrimento, sem você e sem a coragem de assumir que errei ao investir nessa história de amor.

Eu sei, não existe mais volta, muito menos explicações. Para falar a verdade, é esse vazio inexplicável que me faz não desejar outro fim para nossa história. Seria cruel demais resgatar a esperança de consertar o que deu errado. A verdade é que a gente sabe que nosso amor não tem reparo, não tem conserto, não tem segunda chance. Danificou assim que decidimos desistir de nós dois e da promessa de sorrir até mesmo quando nada desse certo. A verdade é que os arranhões não cicatrizam se a gente insiste em cair no mesmo lugar todas as vezes que decidiu levantar.

Talvez ainda guarde os pequenos pedaços de você secretamente e resolva relembrar cada vez que a sua ausência doer um pouco. Talvez eu continue mentindo até acreditar que esqueci nós dois de verdade. Talvez eu ainda more em você, me esconda em você, machuque você e provoque toda a ausência do nosso fim em seu peito. Mas, a gente nunca quis explicações para as nossas fantasias, muito menos para as nossas decepções. A verdade é que desistimos de remar. Afundamos. Naufraguei. Mas continuo fingindo que você foi passado e ponto.

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Carta para os teus sonhos


Para ler ouvindo "Jogo do Contente"

Ei, menino. Estava te observando faz algum tempo. Ontem mesmo, te vi cabisbaixo, reclamando dessa tal de mudança que nunca chega. Parece que os dias continuam cinza mesmo que teu coração pulse forte toda noite desejando pelas cores. Lembro bem de quando você me contou que o teu travesseiro continua sendo o seu melhor amigo nas madrugadas de confidências, sonhos e melancolia. Sei bem como é isso. Me entrego as palavras quando nada parece ter solução.

Mas agora eu preciso te contar uma coisa. Teus sonhos não ganham asas sozinhos. É preciso determinação e coragem. Eu sei que essa coisa de deixar tudo para trás te apavora. É como se você tivesse começando do zero e, cá entre nós, o mundo é feito de gente que se assusta com a possibilidade de recomeçar. Um namoro, uma amizade, um trabalho ou até mesmo uma troca de visual: recomeçar é sair da estrada que você sabe que não vai dar em nada. E vamos ser sinceros? É muito melhor uma nova tentativa de encontrar o caminho certo do que viver uma esperança falida.

Às vezes, menino, a felicidade está ali, na porta, mas não do lado de dentro. Às vezes, a felicidade mora do outro lado da porta, e é preciso ter coragem de abri-la e ir embora. É preciso abrir mão, deixar de lado o seguro, esquecer o habitual e, simplesmente, seguir em frente. Não precisa olhar pra trás o tempo todo e se contentar com o que conseguiu até aqui. Inspire-se nas conquistas, mas saiba que daquela porta em diante existe um mundo de descobertas que pode ser seu. Ouse se desprender, ouse dizer que tudo é possibilidade, ouse inclusive duvidar do que virá. São nas certezas que mora o perigo do que é cômodo, e comodidade nunca mudou o mundo de ninguém.

Abre esse sorriso, aguenta firme o embrulho no estômago e leva contigo só o que acrescenta, menino. A felicidade pode até esperar sua coragem chegar, mas o tempo, definitivamente, está decidido a te roubar cada minuto em que você vacilou por esperar demais. Coloca na mala seus sonhos e faça uma viagem diariamente. É, aquela viagem por cada pequeno desejo. Mudar é sempre a melhor escolha quando os tons que pintaram seus dias já não colorem sua alma. Mudar é dizer que você quer mais do que o suficiente; que o habitual não te convence mais; que as coisas até aqui não te bastam.

Deixa de lado essa mania de abaixar a cabeça para os teus medos e dê espaço para que a coragem dos teus sonhos se tornem verdadeiros balões no ar. Vá em busca de um lugar que ninguém nunca saberá como é, mas que te colocará em um caminho surpreendentemente mais feliz depois que desistir de ficar parado. Se nada der certo, outras portas vão aparecer para te mostrar que o fim só existe para quem decidiu não mudar.