sábado, 23 de janeiro de 2010

A infinita janela de casa


"O mais importante do bordado é o avesso. O mais importante em mim é o que eu não conheço" (Maria Bethânia)

Foi de lá que eu cheguei naquela tarde de domingo. Dava pra ver a goiabeira ainda, quase sem galhas, mas em pé! Ainda via o menino que subia nas telhas de casa para chupar goiaba, mesmo sabendo que ia ouvir os berros de reclamação depois. Era a coragem de um pequeno herói, o desejo de fazer diferente do comum, a sensação do perigo. A goiaba nem era tão doce quanto as que tinha na geladeira de casa, mas o ácido da aventura o estimulava a sair da janela.

Abro a janela! As recordações são inevitáveis, aquelas mesmas de um tempo que eu cresci sem cair da bicicleta porque preferia olhar. Talvez meu trauma seja menor quando leio Tati Bernardi dizer que existem aqueles que sabem falar de si tão bem por conviver intimamente com as histórias que um dia ensaiou nos desenhos. Não foi bem assim que ela disse, mas eu digo. E me apaixono a cada texto por ela!

De volta a janela, acreditei ser lá meu refúgio, só esqueci de me avisar que não devia ser moradia. É bom subir na goiabeira vez em quando, cair da escada, ralar o joelho e sair do intimismo dos contos de herói que só ficam no papel. O parapeito não pode esquentar com os braços, só vale sentir o friozinho raramente. Mas mesmo ouvindo Bethânia cantar a janela do nunca mais, resolvi procurar debaixo do meu travesseiro a coragem do menino das telhas. Vai ver ele me ensina o caminho da porta ou pelo menos onde se esconde os mais ácidos desejos.

Texto de Patrick Moraes

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

De pote vazio

"Eu faço e desfaço, contrafeito. O meu defeito é amar demais" (Maria Bethânia)


Conhecer, conversar, ficar, conhecer mais, ficar sério, namorar, amar. Esse rito me cansa de tal forma que eu preferia ser adepto ao sem compromisso e com prazer. Não que eu gosto sem prazer, de forma nenhuma, mas banalidade é vazio demais pra meu pote de ouro. Embora não faça sentido ter um pote cheio se no final ele vai derramar, quebrar e minha gangorra vai balançar como sempre. Sortuda é minha prima que nunca pensou nisso. Se não tem com quem contar sempre do lado, também não precisar ficar semanas lembrando sofrivelmente alguns relances de prazer. É mais prático, aproveita a parte boa do todo e não é nada taurino. Deve ser esse último o problema que me persegue.

E o pior é quando bate aquela crise, quando os meus berros poderiam dizer o quanto eu queria que você se fudesse. Mas não, você sempre foi demais pra eu fazer isso! E mesmo arriscando dizer em forte e bom som que na minha janela você só passa agora, não sei como seria estar perto mais uma vez. Se estar do outro lado da parede que separa o eu do você já fez meu coração descompasar, imagina frente a frente? Queria saber por que você não é mais uma daquelas pessoas canalhas que eu perco a tarde em apontar as cachorrices que me fizeram sofrer. Mas ao invés disso, você foi quem me pediu em namoro com um papel de chocolate e terminou na minha porta olhando triste em meus olhos. Se era tristeza, eu que estou dizendo, vai ver era remorso por algum ato falho.

Eu jurei que faria diferente depois da primeira vez. Passou! Jurei da segunda até a quarta. E mesmo assim, eu continuo a insistir no amor. E adoro ler Tati Bernardi dizer que o amor não existe, já que não há pra sempre. E se não há pra sempre, acho melhor eu acostumar a aproveitar o começo do salto, mergulhar rapidinho na piscina de bolinhas e tratar de sair correndo.

Texto de Patrick Moraes

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Vamos mudar?


"I Know that I must pass this test so just pull the trigger" (Rihanna)

E quando levantei ainda vi aquele mundo em tons pastéis se passando. A árvore da frente ainda esverdeava, a cachorrinha vem de manhã e deita aos meus pés e o mundo continua parado. O meu mundo, só pra ser mais claro! Parece que as tão sonhadas férias perderam o valor na cidade das praças. Outrora eu me convencia com tão pouco, hoje eu quero mais. Nesse mais nem precisa existir você, só precisar conter ingredientes para fermentar meu bom humor. Pode ser uma noite de excessos, que comece na frente do espelho de casa e termine com os sapatos na mão voltando alguma avenida desconhecida. Se o preço for uma ressaca - até moral, que me deixa o domingo inteiro sem saco de olhar pra ninguém - eu estou aceitando.

Parece que o ano começou com cara de tédio. E mesmo cumprindo um dos 51 itens que escrevi como metas audaciosas - só pra não dizer outra coisa -, eu preciso de mais. Vamos dobrar a coragem, aumentar as oportunindades e multiplicar os copos. Quero me aventurar e escrever os prometidos 25 textos com cara de novidade. O pior é imaginar que todos eles envolvam algum sentimento que cansei de tentar ou mesmo o tapa de luva que tanto recebi.

Nem sempre a árvore da porta de sua casa vai florescer no outro dia. A cachorrinha pode acordar tão disposta e esquecer que precisa de seus pés por mais uns 5 minutos. Mas a grande virada de mesa só depende de quem está disposto a encarar mais um jogo com as cartas que têm. Afinal, o blefe é a arma mais poderosa de um bom jogador!

Texto de Patrick Moraes