segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Contramão

Cause my best intentions keep making a mess of things.
Glee


E agora eu sento no cantinho da sala com um pacote de bolacha de chocolate e simplesmente tento ler meu coração. Já não sei se ele está em pedaços fragmentados e perdi o ânimo de ajustá-lo no tique-taque ideal ou se simplesmente perdi uma peça dele por essas avenidas largas que passo todos os dias. Eu queria conseguir escrever as minúncias que sinto cada noite, queria decifrar o que vejo escorrer pelos dedos. Tanto carinho que simplesmente eu poderia ter agarrado e feito um doce chamado amor. Mas será mesmo que amor a gente faz?

Fico lembrando da quantidade de 'não' que a gente derruba na vida e poderia ter permitido ser 'sim'. Talvez a gente deva aceitar primeiro e amar depois. A via por onde o amor chega é a mesma por onde caminha a paciência, mas é contrária ao desejo puro. O que seduz apenas os olhos passa na contramão e a gente só consegue acompanhar se olhar pelo retrovisor. E aí já não sei se vale a pena seguir apenas um reflexo, um olhar que se dispersa a cada espaço caminhado. E aí eu repenso todo um conceito de amor que vi nos contos de fada, que sonho a cada sessão de comédia romântica com baldes de pipoca. E aí eu já não sei se quero um acaso entregando um presente de laço grande na caixa enorme e colorida juntamente com um cartão escrito "I love you, I need you". Não, definitivamente eu preciso de construção, de amor em pedaços tão pequenos quanto os caquinhos que estou guardando debaixo da cama de casal pra mais tarde sentar e colar. E se você vier pintando em tons de perfeição, eu sei o quanto vai ser difícil o meu tique-taque acompanhar teu ritmo e, mais ainda, sei o quanto vai doer te dizer que antes de mais nada eu quero paciência no lugar de perfeição. Se for assim, valerá a pena terminar a caixinha de doces, se não, a gente refaz os conceitos, mas jamais muda de via na estrada.

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Tortos olhares


Então você pode me encarar, eu não me importo
Você é aquele que não vai a lugar algum.
(Jessie J)


Foi torto aqueles olhos, todos os olhares mal direcionados ou simplesmente perdidos no meio da multidão que nos rodeava. Foi torto todo o jeito como não dedicamos se quer uma palavra ao outro naquele instante em que apenas os ruídos de uma batida contagiava. Foi torto o jeito como eu impensavelmente quis te ter depois disso tudo pelo simples fato de te ver como um desafio.

Já não sei até que ponto se deve levar a inclinação desnaturada que alimentei pelo simples desejo em ter. E, se bem sei, entre os melhores e piores sintomas de um taurino no meio de um mar de maus olhados é a admiração terrível pelo ter. Não te quero tanto quanto me desafiei, você é simplesmente o que não tive mais cedo e preciso brincar um pouquinho agora que te levaram pra casa. Já não sei até onde você perdeu a graça em brincar ou onde eu simplesmente desisti de ultrapassar qualquer limite para ganhar esse joguinho idiota que eu criei peça a peça.

E se tudo realmente perdeu a graça, o último riso fica aqui ou quem sabe mais a frente, quando nos olharmos em meio a uma multidão de maus olhados e nos enxergamos mais uma vez como dois apáticos bonecos de plástico que foram reduzidos a puro desejo no olhar.

Texto de Patrick Moraes

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Sem meus

Ele cantou tão alto, cantou tão claramente
Que fiquei com medo de todos os vizinhos ouvirem
(Florence + The Machine)

Nenhum são meus. Mas sinto tanto em perdê-los, parece uma parte de mim que se vai, acho que um centímetro do ego que inflei com o maior cuidado. São os elogios, os desejos contidos em cada conversa ou simplesmente uma mensagem de texto, são os suspiros secretos e doloridos que, involuntariamente, acabo alimentando. Por mais que pareça pura maldade, é simplesmente um egoismo, uma necessidade de ter tantos que possam preencher o vazio que ocupa todo o espaço na maior parte do tempo. Não, aqui não é oco, muito menos incapaz de ser preenchido. Mas tem resquícios de um passado manchado a sangue e suor, e tem uma porção de vácuo por vezes indeterminada, que simplesmente deixa correr solto, rápido, fulgás.

No mais, eu sei que nunca foram meus. Podem nem ser, ou se forem um dia estarão fadados ao infortúnio de um coração audacioso, mimado e tão treinado que só é capaz de perder a batalha quando o adversário vem armado de besteiras e sorrisos. Mas não basta isso, a guerra não é simples e prefiro acreditar que cultivo um jardim de flores de plástico, com adubo de palavras que servem de ilusões e um nascer de árvores que já não dão frutos, apenas ficam verde na primavera que se aproxima e somem depois. Prefiro simplesmente não contar os pedacinhos de amores que resolvi ir somando na intenção de colecionar um coração gigante, adorável e capaz de fazer tantos olhares perdidos e egos inflamados suspirarem de inveja. Não uma inveja do bem, mas uma inveja simplesmente na sua definição única, do querer assustador e imediato. Mas os meus não são meus, e a inveja só se encontra na posse do outro, nesse caso, é melhor esperar um pouco mais e desejar flores na árvore em um próximo verão.

Texto de Patrick Moraes

sábado, 16 de julho de 2011

Perdas


Lembro de ter sonhado essa noite com um encontro, desses casuais e inesperados. Era um mago, daqueles velhos que simplesmente mistura simpatia e apreensão. As palavras trocadas foram tão sutis que sou incapaz de remontá-las aqui, seria como tentar colar o delicado abajur que iluminava meu quarto durante a infância. No final, eu lembro de ter lhe perguntado o por quê de perdermos elementos tão essenciais e mágicos em um simples piscar de olhos.

Remontando ainda minha infância, doeu no peito aquele momento inesperado, que só foi capaz de me tirar da boca um "e lá se foi o homem que soube ser homem". E lá se foi o carinho distante, a preocupação discreta, o exemplo mais firme do que é ser um pai de verdade. A sensação de perda é inevitável, é como o pedaço do bolo de aniversário que você achou incrível e simplesmente te levaram. Era como o brinquedo velho que você poderia ter aproveitado mais, brincado mais, aprendido mais, sentido mais afeto, mas que nunca deixou de ser especial nem menos valioso que tantos outros novos. Mesmo sendo a maior certeza da vida, as perdas não dizem quando vão chegar e o fim potencializa surpresas nem sempre agradáveis.

Aí remontei o presente e percebi o quanto já me perderam, quantos fins simbólicos eu mesmo criei. Lembro de ler dia desses que grande parte das pessoas acabam escorrendo, e mesmo que promessas sejam ditas com tanta paixão, elas podem ser diluídas e quebradas sem nos darmos conta. Os amores eternos: até quando acreditar que você vai encontrar uma arara? E se não for uma arara, que seja um tucano, um cachorro ou um simples gato vira-lata. Lembro de perder tanto carinho pela sensação de asfixia, pelo medo de sentir-me amado de forma avassalaradora. Talvez a gente goste mesmo é da sensação de sofrimento e, inacreditivalmente, se olhe na frente do espelho em uma manhã de sábado não querendo acreditar que sempre foi um sadomasoquista sentimental. Certezas que surpreendem já não cabem mais aqui, é necessário não ter certeza de nada, ter frio na barriga e amar incondicionalmente o desafio da conquista.

E esse relativismo que toma conta das certezas também foi a única resposta que consegui daquele mago de dourado. Perder é simplesmente um estágio relativo que todo mundo mais cedo ou mais tarde passa. Involutárias, escolhidas, sem amor, com uma dose exagerada de nostalgia, perdas são encerramentos de ciclos. No fundo, se o ciclo for montado afetuasamente, ele permance aqui dentro, escorregando aos pouquinhos, mas sempre guardando o perfume de uma essência chamada saudade.

cause my heart recalls that it all seems the same.
corinne bailey rae

Texto de Patrick Moraes

terça-feira, 14 de junho de 2011

Chance

Is it gonna take a long time to love?
adaptado de P!nk

Aquela desculpa de se encontrar em meio ao desencontro de corações e almas já não convence um íntimo que insiste em uma crise existencialista do amor ideal. No fundo, já não sei se a bola da vez é errada ou se, simplesmente, tenho medo de amar. Já não consigo pisar em falso e de repente dar com a cara no chão, mesmo tendo as melhores certezas depois daquela noite juntos. Já não posso colocar a culpa em um passado que nem existe mais, foi diluído em tantos pedaços que é capaz de ser confundido com átomos de amor suprimido. Mas mesmo assim, uso das diferenças para criar defeitos, pra encontrar poréns, pra ser um exemplo de aventureiro que resolveu vestir a armadura e sair em uma batalha contra o inimigo que não existe.

Talvez seja melhor juntos, tentar encarar teus defeitos e de uma vez por todas aprender que vale mais ser amado que amar. Preciso esquecer a ideia de ter prazer com sofrimento, de querer a dúvida e cultivar amores que não me dão certezas. Se for certo demais, não me serve. Se for fácil demais, já me enjoa! Tudo soa clichê mesmo sendo o contrário daquelas comédias românticas de sessão da tarde. O pior é que você não foi quem eu briguei durante todo o roteiro e no final acabamos trocando amores dentro de um bar tailandês em um encontro meramente pelo acaso. Você é a perfeição de carinhos, sentimentos e uma dose de efusividade amorosa que me assusta. Tua entrega é minha excitação e teu beijo foi o suficiente pra me fazer pensar no amanhã como uma boa possibilidade. Preciso desarmar aquele guerreiro alucinado por lembranças tão bem vividas que se tornaram frustações eternas. Preciso me dispor a viver turbilhões de sentimentos presos a um só ser, que seja capaz de me trazer suspiros. Me tragam cargas, me tragam életrons enfurecidos pela falta do teu toque, que eu retribuo com certezas as dúvidas que eu alimento.

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 27 de maio de 2011

De volta

I forgive you once again.
Adele

Pronto, aqui estou no retorno de uma estrada que talvez tenha uma saída bem distante, um cruzamento sem placas de orientação e um engarrafamento de sensações. Eu preciso estar de volta e precisava mais ainda terminar uma viagem que abandonei por conta de um atalho mal tomado. Falando em atalho, a via principal congestionou depois de tanta atenção, de uma velocidade acelerada de saudade com desejo, de um simples tocar de corpos naquela noite fria. Aconchego, calor, teus olhos pequenos, suas mãos grandes e um aperto desesperado no peito. Eu era uma bomba relógio pronta pra explodir com a próxima frase que saísse de sua boca. Por sorte, você falou pouco! Queria tantas outras coisas que até as minhas palavras se perderam na estrada principal, deixei do lado de fora e fechei a porta do carro.

Desesperador a aflição de não saber onde exatamente eu ia conseguir fazer o retorno e seguir adiante. Desesperador saber que uma hora você decidiria puxar o freio de mão discretamente e eu perderia o domínio do volante que tanto ensaiei durante meses. Mas eu escolhi essa rota, mesmo sabendo que no primeiro desvio eu poderia mais uma vez fugir, correndo, machucado e sangrando. Mero engano achar que a gente sempre está preparado pra uma nova fuga, um novo combate. Não dá pra anular esperanças quando se ama, não dá pra esconder afetividades quando se existe um amontoado delas. E foi só Adele tocar no som do carro pra eu perceber que talvez não exista mais um "nós" tão forte como antes, talvez o tempo nos fez perder o vulcão de similaridades que um dia nos tornou só amores. Amores e uma dose asustadora de inseguranças.

E hoje eu resolvi não me entender mais, não me punir mais, não me torturar com tantas dúvidas que insisto na razão de ser mais fácil. Fácil mesmo é viver, sem pensar, apenas desejando, sentindo e fazendo. Não estou tão pronto pra te encarar em uma situação avessa a que vivemos algum tempo atrás, mas estou disposto a me encontrar na solidão de dois, na tentativa furada de construir um castelo de areia sem baldes ou se quer uma pázinha de plástico. No máximo ganho uma onda pra destruí-lo em segundos e decido recomeçá-lo em outro lugar na praia, mas perto do mar!

Texto de Patrick Moraes

terça-feira, 26 de abril de 2011

Zona de conforto


Like I'm the only one that's in command
Rihanna

Não compreendi muito bem as últimas palavras que você me disse assim que saiu da porta de minha casa. Pra falar a verdade, prestei tanta atenção em teus olhos marejados de um sentimento confuso pra mim, que se quer decifraria meia dúzia de palavras saindo da sua boca. Só sei que ainda te guardo em cada simples detalhe e, insuportavelmente, te menciono nas conversas de bar que tenho com cada nova oportunidade de um novo amor. Meu problema é justamente esse, tentar te achar em cada novo encontro, em cada descoberta. Não existe redescoberta de você, a não ser que seja contigo e isso é barco furado com destino certo: o naufrágio.

E me pego pensando o quanto Murphy insiste em roubar a reciprocidade da minha vida. O quanto meu olhar detalhado desnuda cada pessoa em busca de uma perfeição, onde até mesmo os defeitos devem ser perfeitos pra mim. Não acho que esteja errado em querer pular fora na primeira tentativa de suicídio que me provocarem, na primeira repulsa por uma atitude que simplesmente não se encaixe. Mas acho bem triste não conseguir me livrar da espera pelo cavalo branco. Não existe contos de fadas em histórias onde o mocinho também encarna o vilão. Definitivamente, papéis bem definidos não entram em meu roteiro e isso acaba apontando direções que me perco antes mesmo de chegar. O pote de ouro, é isso! Talvez esteja atrás dele, escondido entre um galho seco e uma folha recém caída do pé. O problema é a rota, a infinidade de tropeços e a minha incansável necessidade de virar a direita quando todos mandam seguir em frente.

E nesses atalhos, ou caminhos alternativos, ou buscas desesperadas por uma esconderijo secreto, que eu encontro divertidas razões para sorrir. Mesmo que temporárias, mesmo que doídas, mesmo que ordinariamente efêmeras. São nelas que consigo descobrir pedacinhos invisíveis de mim, de mudanças contínuas, de curiosidade por outros espaços preenchidos aqui dentro. É um você que reflete os pequenos deslizes e as grandes bagunças, um você que tem tanto de mim, mas com marcas que um dia eu tive e cansei de expô-las. O pior é pensar que consegui abandonar a minha essência e perceber que isso é querer negar uma verdade através de um argumento fundando em mudança. Mudar é adequação. Mais cedo ou mais tarde, você se dá conta que adequou o que tinha aos espaços que te deram agora de uma forma diferente.

E com tantos caminhos trocados, papéis invertidos, mudanças que acontecem sutilmente e um incômodo bobo que marcou o passado, é hora de entender o quanto a zona de conforto te cabe. Sem aperto, sem estar excessivamente folgada, mas na medida certa para entender que as dimensões da sua vida podem ser ocupadas sem se preocupar com os objetos que você carrega do lado.

Texto de Patrick Moraes

domingo, 3 de abril de 2011

Despedaço


Já pensou que quando o trem sai da estação e você simplesmente desistiu de partir, mesmo com as malas prontas, você já não poderá mais entrar nele? Aquela oportunidade de emprego que você resolveu não aceitar, aquele convite para um simples sorvete em uma tarde de domingo que você recusou, tudo que um dia construiu sentado na areia da praia e resolveu entregar às ondas do mar?

Depois de dizer "não" é sempre complicado voltar atrás, depois de virar o rosto é sempre difícil encarar diretamente nos olhos, depois de esquecer é trabalhoso se fazer lembrança. Quantas vezes a gente abre mão sem perceber, dá um passo pra esquerda e não entende que logo em frente existe o verdadeiro tesouro. Às vezes retornar a estrada não é simplesmente engatar a marcha ré de um carro e acelerar. É preciso compreender que determinadas trilhas vão se despedaçando a cada nova curva, que a paisagem lateral se faz de galhos, folhas e, por que não, de horizontes vazios.

Perder a oportunidade de viver outros sorrisos com alguém pelo simples medo de tentar é covardia. Mas perder alguém pela simples covardia de não saber dar valor é incompreensível. Aquela história de a gente só dá valor depois que perde é a pior forma de encarar uma relação que foi pro espaço. Mas antes de ela pegar a nave, a gente se permite cultivar todas as ferramentos de um vôo sem destino de volta. Depois que o pote de jujubas cai no chão, difícil não é conseguir catar as verdinhas preferidas, mas sim colar os pedaços de vidro e se livrar daqueles que se perderam no áçucar sem gosto.

Deixar vazios é charmoso, cativa e cultiva o desejo. Mas toda dose errada é capaz de estragar as melhores intenções. E quando você pensar em viajar de novo, aquele trem já partiu, dança em outros trilhos e a cadeira que seria sua, talvez se encontre ocupada com outra mala, menos sedutora, mas bem mais aconchegante.

Texto de Patrick Moraes

domingo, 27 de março de 2011

Ironicamente

E quem teria imaginado... isso acontece!
Alanis Morissette

Essa noite nem tinha aquela grande lua cheia para eu sentir o desejo de deitar em teus braços e por pelo menos mais uma vez sentir o toque dos teus dedos e o olhar bobo de criança que sabe o quanto está brincando errado. Essa noite eu não esperaria o celular tocar com teu número no visor, muito menos o bipar de umas três ou quatro linhas escritas pra dizer como foi o dia. Essa noite eu não teria a irônica sensação de estar me completando depois do pedaço vazio que sobrou das linhas tortas daquele carnaval.

Ainda sinto falta da atenção inesperada, da voz mimada que embaraçava meus sentimentos na tentativa de me tornar mais uma vez o menino enfeitiçado por uma paixão adolescente e idiota. Brincar sempre foi seu forte, mas quando se tem a chance de jogar novamente a partida fica mais difícil. Eu sei que gosto de jogos, me seduz a simples ideia de mais uma partida onde o risco de sair de campo derrotado é grande. Dessa vez, acho que nem chegamos a rodar o placar, ou simplesmente eu te mostrei que não valiamos a pena assim. Suas regras não contemplam meu tabuleiro e meus peões não conseguem chegar no grand finale do seu.

Agora que eu estacionei o carro na garagem de casa, ironicamente Alanis veio me dizer que quando tudo está ok, a vida simplesmente tem um jeito engraçado de aprontar com você. Talvez tenha sido isso, mais uma piada boba, um simples divertimento de verão, que o vento acabou de levar. Abaixei o banco e fechei os olhos por alguns minutos. Consegui lembrar do beijo roubado no meio da multidão, dos teus olhos cheio de dúvida enquanto eu deitava no seu ombro e daqueles mesmos olhos sorrindo com o coração na mão. Coração doce! Coração que não resiste muito tempo sendo usado. Derrete e acaba. Ironicamente, consegui guardar aquilo tudo com carinho e passar adiante. Quem ousou pensar que vale a pena remoer etapas finalizadas realmente não conhece o sabor das novidades. Você continua nas melhores lembranças, nos cantinhos que consegui ajeitar cheio de doces sorrisos, mas, ironicamente, já não faz mais parte de mim depois que abri os olhos essa noite.

Texto de Patrick Moraes

quarta-feira, 16 de março de 2011

Sinal fechado

What I have to say can't wait, all I need is a day, so let's runaway.
Bruno Mars

Engraçado como um tijolo fora do lugar é capaz de derrubar um prédio inteiro. Já pensaram em quanta coisa poderia ter sido diferente se uma mera peça do quebra cabeça estivesse torta ou se encaixasse em outro lugar? O despertador que não tocou, a chave do carro que você esqueceu na mesa do escritório e voltou pra buscar, o dia que adiou a academia por mero desleixo, a festa que deixou de ir porque simplesmente preferiu chorar por um relacionamento fracassado.

Me dei conta hoje que você é uma dessas peças de quebra cabeça que veio torta. Bem ou mal, tô desmontando um pedaço de mim aos poucos só pra reconstruir um caminho mais rápido de chegar até você. É aquela história do sinal fechado, da luz vermelha, do momento em que aquele velho boné conseguiu me colocar em estado de espera. Incessante e aterrorizante espera! Sou capaz de dizer que você é aquela placa de contramão no caminho que eu cruzava todos os dias. O mero detalhe que consegui enxergar de novo, que conseguiu modificar de novo.

E hoje eu seria capaz de mudar os horários de cada despertador que aparecessem só pra fazer a cidade amanhecer mais rápido. Pegar cada segundo de suspiro só pra dá uma fugida e te olhar, ao menos de longe, pra ver que tá tudo bem. Hoje eu queria ficar instável na estabilidade dos teus braços, na incerteza dos próximos dias, no pulsar agitado do teu corpo e no simples sussurar em meus ouvidos. Eu queria mesmo uma via fora da principal que me levasse no alto daquela montanha e calassem todos os segredos em gestos. Trocar olhares por beijos, silêncio por gemidos, sonhos por toques. Eu sei que o prédio construído até poucos dias atrás está perto de desabar, mas certos tijolos merecem a chance de ser trocados assim que o sinal vermelho acende.

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 11 de março de 2011

Linhas tortas de um Carnaval


Escrevo com tanto tremor
as linhas tortas de um Carnaval
que pareço viver agora
a intensidade do teu abraço.

Já havíamos decidido ser outros dois e nos fazer um casal diferente daquela construção mal acabada. Resolvi te dar a chance de mais uma vez ser, no mínimo, companheiro. Eu até pensei na possibilidade de me atrair de novo, mas o coração só chiou baixinho quando te vi na primeira vez. Superei e ainda sairíamos amigos disso tudo. Ótimo se fosse assim!

Pontualidade realmente não te pertence. Acho que em sua fabricação esqueceram o relógio e acrescentaram mais mãos do que deveria. Mãos de afago, mãos de cafuné gostoso, mãos de um simples segurar na cintura. E de repente eu queria sentir toda a felicidade daquele lugar, engolir cada simples sorriso que exalava dos quatro cantos e subir, o mais alto que eu pudesse, gritando cada pedaço da música. Dançamos, sorrimos e você disse que naquele momento me queria. O chiado simplesmente emudeceu e sorriu, baixinho ainda, tímido. Te dei a possibilidade de me fazer feliz e você conseguiu tornar inesquecível. Se amanhã não for, não tem tanta importância, você foi inteiro ali, comigo. Nossos olhos se beijavam e teu sorriso queria me devorar.

Aí veio a vontade de mais. Veio o desejo de te fazer companhia por pelo menos mais algumas horas, de uma tarde de final de Carnaval. Resolvi arriscar, deixar que os foliões alegres moressem de inveja de nós dois, e sorrir do teu lado naquela fila imensa do cinema de quarta. Resolvi simplesmente me permitir a sensação de perigo. Ganha o jogo quem conseguir levar tudo isso adiante, ganha o jogo quem conseguir sorrir a cada vez que encontrar os olhos pidões do outro. Só perde quem não quiser ganhar, e isso não é assunto pra um dado que mal começou a rodar.

Texto de Patrick Moraes

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Sem remo


But there's a side, to you, that I never knew, never knew.
All the things you say they where never true, never true.
Adele

Ilhado. Cadê o barco que eu deixei escorado logo ali perto pra fugir em situação de emergência? Cadê a boia laranja que eu guardei com tanta força pra simplesmente saber usá-la quando preciso? Parece que foram embora todos os poréns e ficaram as angustiantes condicionais do se. Sinto-me preso em meio a tantos iguais que conseguem me ilhar num íntimo imperfeito, ou perfeito demais. Talvez eu sonhe com o brilhantismo, o papel perfeito para mostrar que existe sim valores. Mas me prendi na fantasia de um cisne, nem negro nem branco, apenas cheio de asas cortadas que não conseguem se mover. Sinto que minhas fases de maturação resultam sempre na decepção por escolhas erradas e consequências terrivelmente arrasadoras.

O que parece ser boneco de vitrine é tão oco que num simples esbarrão se transforma em cacos. Verdade seja dita, os grandes encantos começam pelos olhos, mas não se satisfazem nele. Esquecer os carinhos que pareciam tão sinceros se torna fácil depois de tanta sujeira, de tanta mentira inventada com o simples propósito de tornar valores descartáveis. Te recriei agora em duas palavras, assim como você se inventou em duas pessoas. Já não consigo distinguir a cachorrada da covardia e talvez nem você consiga separar tão fácil assim. Vive junto com ambos e alimenta os dois em medida tão compaçada que acaba tropeçando nas pedras que sem querer escapa do seu bolso.

Mesmo frágil, mesmo com autopunições, mesmo com a terrível mania de perfeccionismo amoroso atormentando cada milésimo de segundo que tento reorganizar a bagunça de um simples final de semana, a vida continua. E você? Você simplesmente passa com uma marca negra, aprendendo que fazendeiro que não tem condições de cuidar da plantação grande, acaba não colhendo nada quando o temporal chega.

Texto de Patrick Moraes

domingo, 30 de janeiro de 2011

Confessional Dois


Eu sei guardar segredo
Eu sei amar.

(Sandy Leah)

Troquei a blusa, tirei o tênis, peguei um pedaço de papel velho e escrevi a palavra mais importante do mundo nessa noite: CANSEI. É, nada mais me basta e dizer isso parece nem bastar para que meus sentidos se dêem conta e saiam em busca de um outro cansaço menos fadigado. Olhei pra trás e percebi que as últimas marcas pisadas nem de lama eram, ficaram tão fracas que mal consigo deduzir de que lado que eu vinha. A caneta começou a falhar bem na hora que eu ia escrever as primeiras letras da palavra amor. Só podem estar de brincadeira! Eu sei que amor que se preze a gente não encontra na esquina, meia noite de um sábado. Acredito mesmo é na fila da carne dentro do supermercado, em uma saída despretensiosa para comprar o pão ou, fatalmente, em uma batida de carro na esquina do prédio.

E se desespero é sinônimo de carência, talvez meu dicionário precise de algo um pouco parecido para conseguir explicar o meu desassego. A ideia de estabilidade me parece agora a pior possibilidade, preciso é de tremor, calafrios e uma necessidade angustiante no peito de repetição. Ser livre me basta até o ponto em que não sei mais pra onde dirigir e, em meio a ruas desertas, resolvo fazer a volta, pela contramão, e estacionar em casa. Subo, 65 degraus, e deito. Aqui talvez me baste e aqui talvez eu queira voltar sempre que doer. Uma hora da manhã, a noite terminou!

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Confessional


We were born and bred in a summer haze bound by the suprise.
(Adele)

Sexta-feira, nublada, chuvosa, do jeito que há muitos dias eu não sentia. Ainda estava naquela cidade, ainda vivia em pleno verão, mas talvez aquele fosse um pequeno indício que nada permanece como está pra sempre. Já não sei mais o que me basta, acho que sumiram com a peça do quebra cabeça que continua a sequência de amores inacabados e alucinantes. Rasgaram! A folha rosa citilante caiu na poça de lama logo ali em frente e perdi a vontade de me melar para salvá-la. Experimentei novidades da mesma essência sem consistência e vazias.

Cheguei até a passar na porta do passado, e, por pura fragilidade, olhei pelo portão em busca de uma luz acessa. E se tivesse luz? Já não sei se prefiro ficar no escuro ou me fazer cego em meio a holofotes descaradamente sofríveis. Mas passado gostoso que se preze tem que machucar pra ser lembrança. Cresci aqui, mas parece que deram corda para o boneco agora. Talvez eu queira um eterno verão, sem amarras, com uma dose de segredos, porém com um queimor angustiante no final da noite.

Acabei aceitando a caixa de chocolate e deixando o sentimento de cada bombom de lado. Não me tornei amargo, só não quero ser doce a ponto de enjoar na última mordida. Antes do final a gente pode escolher parar e dar continuidade em outra frequência. E melhor que sejamos sinceros, que fiquemos perdidos em nossas confusões e que, mais cedo que ontem, você descubra o quanto eu posso tropeçar em certezas. Não, eu simplesmente crio barreiras quando a visita não é bem vinda. Nos demais casos? As portas vivem destrancadas, é só bater com jeito e limpar os pés no tapete vermelho antes de entrar.

Texto de Patrick Moraes